terça-feira, novembro 28, 2006

Balanço pessoal sobre o X-Ceará 2006

por Paulo Reis

Seguindo o exemplo do Gonçalo Velez, decidi tirar as minhas conclusões e relatar as minhas experiências referentes à participação no X-Ceará 2006. Participar no X-Ceará foi para mim uma experiência única para a qual não estava devidamente preparado! A minha decisão em participar foi tardia, pois a menos de duas semanas do início do evento surgiu a oportunidade de tirar 9 dias de férias e não hesitei em inscrever-me à última da hora. Fiquei demasiado apreensivo, pois não sabia exactamente no que me estaria a meter, mas a vontade de participar era muito intensa. O voo de croos-country é para mim tudo o que eu sempre sonhei e desejei fazer enquanto piloto de parapente e desde que existe este evento há 11 anos, que sonhava em participar!
Existem sonhos que, quando pensamos demais nu
nca se realizam! Para mim não existiam objectivos ambiciosos à partida, pois humildemente sabia que iria encontrar condições de voo muito diferentes do que as que encontro habitualmente aqui em Portugal. Este é um evento que tem características muito próprias, pois em muito poucos lugares do mundo se descola às 8.30h da manhã com vento forte e bastante térmica à mistura, sendo que a térmica mais forte do dia normalmente aparece logo na descolagem.
As descolagens são sempre um momento de extrema concentração e confiança nos ajudantes da descolagem. A sensação que tive foi que a minha vida estava na mão daquelas pessoas que nos ajudavam em cada descolagem. Senão vejamos: As rajadas atingem picos de 50-60 kms hora e as oportunidades de descolar são muito reduzidas, por outro lado estamos de costas para o vento e mal a asa sobe somos catapultados para o ar. Se inflarmos a asa no momento da rajada forte, é bem provável que se venha a conhecer bastante bem o rotor do monte. A saída da encosta e a partida para o voo de distância deve ser feito sempre na base da núvem ou dentro dela e por vezes é necessário ficar à espera do ciclo ideal para subir longe da encosta e derivar para trás. Com descolagens tão cedo, acaba por ser um totoloto aguentarmo-nos a voar nas primeiras horas do dia. Muitos aterram a 20-30 kms por precipitação e os sobreviventes acabam por fazer mais de 300 kms. Confesso que fui um dos assíduos precipitados, pois não consegui perceber logo inicialmente as características deste tipo de voo e tomei sempre decisões precipitadas, que num local onde as descendentes podem ir até aos -7 se pagam rapidamente com aterragens imediatas.
Os gatilhos das térmicas aqui são difíceis de identificar no solo, pois a componente de vento forte baralha tudo e as térm
icas são nitidamente arrastadas junto ao solo por diversos kms. Tive a nítida sensação de que as térmicas se formam em escada e por vezes junto ao solo são quase sempre apenas bolhas desorganizadas e turbulentas. A técnica que me pareceu melhor e pude constatar nos últimos dias da prova para voar longe e com garantias era sempre ficar sobre a influência dos cúmulos que se formavam, por vezes até era preferível enrolar a -0.1 e -0,2 do que arriscar transições longas em descendentes brutais. Apenas consegui interiorizar isto nos últimos dois dias, pois nos primeiros havia demasiadas varáveis a aprender e dominar, bem como a confiança não era muito grande e tudo era novo!
Cometi ainda diversos erros devido a estar l
eve na asa e neste tipo de condições estes erros pagam-se caro! Nos primeiros dias levei 10 kgs de lastro líquido e díficilmente me conseguia movimentar dentro da selete e a asa fechava demasiado.
Nos dias seguintes levei mais 5 litros de lastro, distribuídos de uma forma mais equitativa e o comportamento da asa melhorou significativamente. Quando comecei a adaptar-me ao calor, às descolagens e aterragens radicais, a
voar sempre junto à nuvem, consegui fazer um voo interessante de 70 kms que me fez realmente ver as potencialidades do local. Neste voo constatei que o dia ia melhorando sempre gradualmente, e os cúmulos formavam-se no sentido inverso para onde seguia a rota. Por diversas vezes fazia trechos de regresso contra-vento para encontrar as térmicas e resultava na perfeição. Fiz estes 70 kms em 1.30h, sem uma única transição comprida, apenas enrolando constantemente debaixo da nuvem e deixando que o vento trabalhasse em meu favor! Tive um momento em que me desconcentrei e vi as montanhas a aproximarem-se rapidamente e pelo meu IQ Compeo o vento estava demasiado forte, o solo era formado por matas de picos e cactos agrestes, por vezes andava a mais de 95 kms/h. Assustei-me um pouco e decidi estupidamente terminar o voo por ali, pois não estava mentalmente preparado para entrar naquela zona de montanhas e possivelmente ter de aterrar num rotor de uma delas! Aparentemente consegui sobreviver e passar a zona que todos os pilotos consideram mais díficil e a partir daquelas montanhas tudo é possível…
Outro aspecto muito dramático no X-Ceará são as aterragens a andar para trás! No ceará o vento só diminui ao pôr do sol, altura em que é seguro aterrar, isto nos dias em que não entra a brisa do mar (chamado de vento Aracati)! Qualquer outra hora do dia, e especialmente na altura de maior insolação, as aterragens são altamente complicadas. Lembro-me de que apenas consegui aterrar a andar para a frente num dos voos que fiz por lá! Todos os outros foram a andar para trás e alguns com arrastamentos no meio de cactos e vegetação agreste. O maior erro e pelo qual paguei caro foi o de voar leve! Não aterrei dentro duma lagoa por sorte num dos dias, num outro aterrei parachutado e num outro dia tive demasiados fechamentos assustadores e sucessivos junto ao solo, aterrando a 3 kms do local o
nde fizera a aproximação inicialmente.
A companhia do Gonçalo foi excelente, a organização é impecável e as recolhas são demoradas, pois a rota segue por uma estrada de areia e não é fácil encontrar pilotos que não aterrem junto a essa estrada, o que acontece com regularidade.
O ambiente do evento é pouco competitivo e para muitos o desafio é pessoal e gradual. Enganam-se todos aqueles que pensam que ir ao Ceará é garantia de grandes distâncias!
O Ceará é uma escola de voo e humildade! Muitos dos pilotos que por lá andam a fazer distâncias superiores a 300 kms, voam regularmente por lá, têm participado em muitos dos anteriores eventos e conhecem muito bem o local. O vencedor do evento andava a voar na zona há mais de um mês com apoio da Sol paragliders. O segundo classificado participou em 10 dos eventos dos anos anteriores. Se conseguir voltar ao X-Ceará para ano como é minha intenção, terei novos objectivos e a experiência que adquiri este ano de certeza contribuirão para bater o meu recorde pessoal de distância.

sábado, novembro 25, 2006

XCeará 2006, Nov 13-17

por Gonçalo Velez

Estas são as minhas conclusões, reconhecimento das minhas limitações, memórias das minhas experiências, para relembrar no próximo ano a fim de evitar os mesmos erros –

Participar no XCeará é sempre uma experiência aliciante não só pelas condições de voo radicais mas também pela dinâmica da organização e o ambiente social, não só entre pilotos, mas também com o pessoal da organização, sobretudo os recolhas, e a população. Ah… e aprendi a da
nçar forró!
Este ano o regime foi igual ao do ano passado: acordar às 6h, pequeno almoço a partir das 6h30, primeiro transporte para a descolagem às 7h, primeiras descolagens tão cedo quanto as 8h45!
Convém descolar entre as 9h30 e as 10h30, o máximo até às 11h. Depois das 11h é pro
vável instalar-se um vento muito forte. Antes das 9h30 as condições são fracas.
Os pilotos mais competentes e que pretendem passar os 300 km descolam perto das 9h mas correm grandes riscos. Só poucos atravessam a zona crítica (80 km), e os que o fazem apanham depois muito melhores condições.
Este ano senti que a minha Tattoo (dhv 2), para as condições de vento que se fizeram sentir, muito fortes, care
cia de velocidade, sobretudo no vento da tarde. Várias vezes, por cima da descolagem, tinha de avançar de acelerador para barlavento. A capacidade de manobra com esta falta de velocidade é bastante reduzida, o que permite explorar muito menores possibilidades de voo. Fica-se parado, e chegar a qualquer sítio é moroso e demasiado propenso a ser-se apanhado na descendente durante demasiado tempo.
Este ano voei menos e achei as condições menos boas. Muito mais nebulosidade tornaram as condições mais fracas, os
tectos mais baixos, e as térmicas mais deitadas (mesmo vento e ascendente mais fraca).
Pelos resultados impressionantes dos pilotos de to
po dá ideia que no XCeará basta inflar a asa e esperar umas horas que já se ganharam mais de 200 km…! Não é assim, bem pelo contrário…
As descolagens são o momento mais delicado do voo devido ao forte vento (30-50 kmh) e aos ciclos curtos e incertos. É recomendável esperar que passe uma nuvem e cubra de sombra toda a zona à frente da descolagem. A nuvem faz abrandar a brisa de montanha oferecendo uma maior segurança para descolar.
Na descolagem não é boa ideia ficar a olhar para a asa quando ela já chegou à vertical com risco de sermos levantados em reverso! No XCeará tem de inflar-se a asa direita e simétrica, e virar-nos antes dela chegar à vertical. Assim, se formos levantados já estamos em voo!
A sul da descolagem a cumeada eleva-se num rochedo enorme (140 mtr) e a subida é quase sempre garantida por uma ascendente termodinâmica. No entanto, as térmicas que aí se libertam são sofríveis e é preferível avançar para barlavento na direcção de qualquer nuvem que esteja ao alcance. Em alternativa espera-se que uma chegue. O lago a NE
da descolagem também liberta boa térmica e nota-se a sua superfície tornar-se enrugada.
Os primeiros 60-80 km têm de ser voados em regime de sobrevivência, aproveitando todas as menores ascendentes que se encontram, nunca as perdendo. Avança-se enrolando térmica e viajando na sua deriva. Ao saír-se dela para sotavento, a maioria dos pilotos regressava para barlavento para continuar na ascendente enquanto houvesse, por que o risco de voar-se na sua descendente é grande.
Partir para o desconhecido implica a maioria das vezes encontrar-se uma descendente de –7 e voar-se nela até ao chão.
Aqui compreendi ainda melhor a necessidade de ser-se paciente, muito paciente, e de enfrentar-se a adversidade friamente. Tal significa que depois de um longo trabalho para subir conclui-se que se obteve uma altura insuficiente e regressa-se à posição inicial, acima da descolagem, perdendo-se, nesse regresso, muita altitude. Isso é obrigatório fazer-se acima da descolagem para partir-se com boa altitude, mas a prudência obriga que se faça também ao longo do voo, sobretudo quando se voa na planície e não há referências de
gatilhos.
Mesmo os que se encontram (montes, lagos, aldeias) não libertam a térmica da forma a que estamos
habituados em Portugal. A configuração da térmica não obedece à que conhecemos. Os fumos de queimadas que víamos viajavam deitados centenas de metros e depois subiam. Isso explica a enorme dificuldade de prever-se onde a térmica estará a subir.
Muitas vezes voam-se bolhas: sobe-se, roda-se a perder, encontra-se outra bolha mais para o lado e na deriva… O trabalho é duro, implica mais paciência e perseverança. Esperar que se solte uma térmica consistente pode implicar pairar nos locais prováveis em que elas passem, locais onde se notou que outros pilotos subiram. Infelizmente não vi muitos urubus que me ajudassem.
Percebi melhor o exercício psicológico que tem de fazer-se para se voar de forma consistente. Neste momento da minha evolução já adquiri um bom domínio da pilotagem de âmbito físico, mas dou-me conta que há um trabalho enorme a realizar de cariz intelectual e psicológico, que me impeça de ser impaciente e de facilitar, optando por soluções mais imediatas, e que me motive a realizar um trabalho que é enfadonho, moroso e aparentemente frustrante. É este aspecto que preciso de treinar.
O erro típico, muito grosseiro, consiste em ver asas que subiram mais depressa e mais alto, e que partem, e pensar: “É pá, estou a ficar para trás. Bora partir e depois no caminho logo se vê a térmica que se encontra…”!
Esta decisão é muito errada, resulta de impaciência, e produz resultados maus. Tenho feito isso demasiadas
vezes!
É interessante notar que, o que às vezes nos parece uma vantagem, não o é: muitos que partiram cedo, fizeram-no em condições deficientes, talvez apressadas ou forçadas, e parecendo que levam vantagem, estarão no chão qua
ndo por eles passam os “atrasados”!
Tive um exemplo de enorme persistência no último dia de prova no qual vários pilotos descolaram perto das 9h. Metia dó observar o trabalho que tiveram de fazer pois, com condições tão fracas, subiam passando para trás do monte, depois tornavam a vir à frente confiando que o cúmulo seguinte tivesse boa ascendente, subiam, regressavam... Ocuparam-se desta tarefa mais de uma hora! Imagino o desgaste que isto lhes produziu.
Impaciência tem s
ido o erro da maioria dos pilotos no Xceará por que as descendentes brutais não perdoam esta veleidade. Perguntei a opinião do dono do nosso hotel: o Almeida, deltista. Dizia-me para saír no sotavento da térmica e atravessar a descendente no máximo de velocidade.
Eu acho que isso se aplicará melhor aos deltas. Parece-me que o parapente, com a sua reduzida velocidade, deve saír do cimo da térmica a 45º do eixo do vento, senão voamos a deriva da descendente e saíremos dela com muito custo, ou nunca saímos!
Em todo o voo é necessário observar o céu, sobretudo quando se sobe na térmica, preparando antecipadamente o passo seguinte. É importante ter uma noção do rumo que as térmicas tomam, o eixo da direcção do vento, e o seu espaçamento. Como as térmicas viajam muito deitadas, a nossa distância para a ascendente da nuvem pode ser maior do que aquela a que estamos habituados em Portugal. Lembro-me de ter feito uma
vez pontaria a um cúmulo e nunca ter conseguido chegar à sua ascendente! Em Portugal teria encontrado a sua térmica…
A sotavento da descolagem, em cerca de 20 km, há uma região onde a maioria aterra por que tem rara
ascendente. Notava-se pelo azul do céu que frequentemente aí se observava. Aí aterrava uma grande percentagem de pilotos. A aldeia de Custódio é local de encontro, e essa pista tem sempre vários pilotos debaixo de uma sombra esperando por recolha.
Evitavam-se os montes a SW por intimidarem devido à aparente falta de aterragens, e os montes a NW implicavam atravessar o vale de Quixadá que é uma etapa longa. O “segredo” reside em partir-se bem alto junto com um cúmulo e observar se se forma outro a sotavento do lago de Quixadá.

Neste XCeará tive algumas experiências novas:

a) Enrolar até saír por cima da nuvem. No começo do dia os tectos estavam muito baixos e furar a nuvem era uma grande tentação. É intimidante andar a girar no branco durante tanto tempo (500-700m), vendo o orvalho acumular-se no neoprene da selette e as bandas a escorrer um fio de água contínuo, depois… faz-se luz , e aparece az
ul! É espectacular, e um alívio. Só o recomendo quando tivermos a certeza que estamos sós.

b) Tive o azar de descolar uma vez quando se soltou uma térmica brutal. A asa a subir e a recuar, o acelerador a 50% não era suficiente. Empurro para os 100% (talvez demasiado bruscamente) e sofro um frontal brutal com as pontas da asa a tocarem-se. Na abertura ainda sou projectado mais para trás e começo a derivar como posso para norte, com acelerador a 50%, que é onde o monte diminui de altura e onde o rotor é menor. De repente, sofro um assimétrico intempestivo com rotação a 180º (voo com a asa carregada a 97%), vejo a asa a rodar praticamente na vertical. Deixei de pensar em regressar à descolagem e continuei a derivar mais para norte à procura de térmica nas bossas que lá havia ainda esperançado de recuperar o meu voo, mas nada: só rotor, agora mais brando.
Fiz pontaria a uma depressão que me permitira voar mais longe. Confiei que se soltariam umas bolhas que me levassem lá, mas acabei apanhado numa descendente e perdi a finesse. Acabei a arborizar nos arbustos, por sorte sem nada sofrer, nem eu nem a asa (uau que bela serra encontrei dentro da minha selette!).
Houve quem me dissesse que o que deveria ter feito seria enrolar aquela térmica e saír a voar para trás. H
ei-de pensar nisso numa próxima, contudo a realidade é que temos a mente algo formatada da instrução de nível 3: nunca nos deixarmos arrastar para trás do monte.

c) Aconteceu-me algo de muito estranho, que podia ter tido más consequências. As linhas dos manobradores da minha asa são muito finas e vão-se enrolando, e fazendo novelos. Já tinha notado que o manobrador esquerdo estava mais curto devido a estas torsões, mas não liguei, pilotava com uma mão mais alta que a outra...
Uma tarde descolo e, em voo, reparo que o manobrador esquerdo está bloqueado e a asa travada desse lado a uns 50%! Fiz força, tentei separar as linhas presas, sem sucesso. Felizmente que as condições não estavam temíveis e só com o manobrador direito consegui pilotar até um campo à frente da descolagem e aterrei travando a banda D. Qual não foi o meu espanto quando não encontro a causa do bloqueio. As linhas estavam todas livres!!

Mais relatos do XCeará 2006 no blog do Paulo Reis.

fotos: William Mevo-Guyot, Paulo Reis

quarta-feira, novembro 22, 2006

Voar numa canoa

por Gonçalo Velez

Comprei uma X-Rated 3 praticamente nova antes do início do XCeará 2006.
Não houve tempo de adaptação, foi voar logo com ele após uma regulação ao fim do d
ia com muito pouca luz. Por sorte regulei-o bem, éramos alguns 6 pilotos de cervejas na mão à volta do arnês que pendurei num telheiro do hotel.
Curiosamente foi no 1º voo que talvez me tenha sen
tido mais confortável, embora com pouco apoio no cima das costas. Depois fui fazendo pequenas alterações cada vez que aterrava. Ainda não me sinto totalmente confortável. E ainda a tenho a voar na horizontal, sendo que a posição correcta sejam as pernas apontando ligeiramente para baixo. Ainda não sei bem qual a inclinação das costas que me convirá mais. Um francês disse-me para desapertar tudo e começar do zero, o que não fiz, mas que foi o que ele fez.
Não percebo por que estes aparelhos tão complexos não
trazem um manual. Há-de haver uma sequência lógica de regulações.
Desapertei totalmente o ventral e as alças dos ombros e gosto da sensação dos movimentos da asa.
O que não sei é se vou conseguir voar encafuado, com as pernas sempre paralelas e com pouca mobilidade. É a sensação do kayak. Estava habituado a deitar-me para o lado e cruzar as pernas. Agora isso não é possível. Só se consegue levantar (pouco) uma perna e fazer pressão com a coxa oposta e pender a cabeça para o lado para que se vira... Não é nada prático pilotar com movimentos de cabeça!
No que respeita à pilotagem com o movimento do corpo sinto uma grande regressão.
Os mosquetões também não estão suficientemente baixos para que a viragem
se faça com facilidade. Talvez esta altura se justifique com uma dhv 3, mas não com a minha dhv 2.
O Paulo diz-me que a asa gira mais plana, mas não tenho a certeza.
O espaço de armazenagem é reduzido, ainda mais do que na X-Rated 2, mas consegue-se encafuar a bagagem, se bem que o ventilador traseiro me parece que fica saído, quando essa pala devia estar para dentro. Isso acontece por excesso de bagagem.
A minha mochila no Cear
á pesava 30 kg com 3 ltr de água! A selette pesa mais 5 kg que a minha anterior Charly Zip-II. Não é possível correr com tanto peso para descolar num dia sem vento na Arrábida ou no Larouco.
Cheguei a suar das pernas quando o tronco estava fresco devido ao isolamento do neoprene, é um contraste grande, talvez exagerado.
Ela traz uma grande vantagem no uso do acelerador pois ele está sempre posicionado no local certo e é muito fácil de encontrá-lo.
Esta s
elette pode ser um benefício do ponto de vista da aerodinâmica, mas desconfio que não o será em conforto. Ainda não a considero definitivamente regulada. Há tantas combinações de ajustes a fazer... Ainda não estou convencido.
Relativamente às selettes canoa oiço dizer que este é o modelo mais completo, mais bem acabado e mais versátil.
Alguns franceses andavam excitados com a equivalente Avasport...

fotos: Woody Valley, William Mevo-Guyot

quinta-feira, novembro 09, 2006

Iquique 2006

por Gil Navalho

28.10.06
Viva, estou em Iquique para o Open Chileno.
Hoje foi o primeiro dia de manga, fomos para um local a cerca de 50kilos a sul de Iquique.
A paisagem é simplesmente a "puta da loucura", com o deserto do Atacama a ir mesmo até ao mar.
Estão a participar cerca de 60 manos. A manga foi de 45 kilos. Ganhou um Colombiano numa Boom4, junto um Sul Africano numa daquelas bananas voadoras e o Navalho ficou em terceiro. Iria ficar em 4º, mas um dos marmelos que ia à minha frente fez o favor de marrecar a 1km do golo. Estava vento forte de frente na ultima tirada e muitos morreram ali mesmo na praia! Julgo que o site do campeonato não tá a funcionar, tal como muitas outras
coisas aqui no Chile!

Depois dou mais novas, bons voos

29.10.06
Hoje tivemos a 2a tasca, toda realizada na zona da cidade de Iquique.
Foi uma maga de 38 kilos, mas alucinante. Termal de +7 em falésias com 700m, convergências maradas, "cum filha da puta", ou dois ou três. Nunca tinha voado uma manga tão louca.
A transição final é por cima da cidade. Vínhamos num grupo de 6 manos, acelerados até ao osso e chegada na praia. Um Colombiano, numa Boom 4 (que é uma boa asa qd há merda) levou um frontal, gravata, rotação e o reserva abriu pouco mais alto que uma palmeira. Eu estava atrás e vi o filme todo.
Mesmo assim o gajo conseguiu cortar o golo de reserva!!! Um sul africano numa U3 partiu umas linhas e ficou 200m curto... Ganhou um américas
e o Navalho ficou em quinto, mas todos mt próximos. Muito possivelmente alguém foi de .ona hoje no Ranking!!! Sopinha passadinha pró jantar!!! Na geral tá um colombias na frente, depois deve tar um Austrias e depois vem o zé portuga.
Amanha há mais, já percebi que aqui voa-se todos os dias.

30.10.06
Hoje acordei e verifiquei que estava tudo nublado. Bom, toca a saltar da cama, e tomar o PA pra depois arrancar. Apesar de ser uma cena para velhos, papei uma cevadinha solúvel com muito açúcar pra disfarçar o gosto. Confesso que caiu que nem ginjas! E chega muito bem!!!
Mais um dia e mais uma manga, aliás, um mangalho! Tivemos uma manga de 68 kilos.
Isto é de partir os cornos a qualquer um! Nunca eu tinha voado num local em que se pudesse voar sempre, repito sempre, tão rápido quanto as asas possam voar. Ona da Prima! Nem se enrola, nem os tomates, é sempre prá frente e de gás metido até a asa começar a largar peças!
E mais um golo pró Navalho, desta vez em 4o e todos colados.
Ontem estava em 3o da geral mas possivelmente devo ter passado para 4o, pois o caramelo que ontem estava em 4o chegou mesmo à minha frente. E como só tínhamos cerca de 10 pontos de diferença, não sei como terá f
icado agora a geral.
O que sei é que a cevadinha da manha morreu como gente grande!
Amanha teremos a ultima manga e parece que alta festança pra apanharmos todos uma valente carroça.

01.11.06
Terminaram as corridas em Iquique!
Sim, porque isto foram 4 dias sempre de voo alucinantes. Sempre a dar gás forte e feio.
Ontem tivemos uma manga de apenas 35 kilos toda na zona da cidade. O Navalho lá marcou mais um golo pra Portugal. Fiquei lixado no final, estava mais alto no glide final e cerca de 200m à frente dos 2 gajos q me seguiam.
Infelizmente paparam-me a peida mesmo no final, em baixo tinha menos vento... Resultado, fiquei a cerca de 1
5s do primeiro e 5s do segundo.
Resultados finais: 1-Eitel -Chile; 2-Gerald-austria; 3-Zé Portugas
E o alucinante nos resultados foi que os 2 primeiros ficaram separados por apenas 1 ponto, e eu a 6 pontos do 2... Foi muito fixe, um lo
cal que aconselho a todos. Basta uma vez na vida, mas
plo menos 1.

Conclusão
Estive em Iquique para participar no 17 Campeonato de Parapente, prova a contar para o
calendário FAI2, que contou com cerca de 60 pilotos. Foi a primeira vez que voei em Iquique. Cheguei ao local 3 dias antes para entender a dinâmica de voo do local. Qualquer piloto de parapente deve ir pelo menos uma vez na vida a Iquique. É uma espécie de MECA do voo livre. Voa-se todos os dias, sem excepção. Em quatro dias tivemos quatro mangas. Todas extremamente rápidas e competitivas. Eu nunca tinha voado num local em que se pudesse voar sempre tão rápido quanto a asa possa voar. Trata-se de um voo de falésia junto ao mar mas com térmica que chega aos +8m/s! O vento é sempre do quadrante SW. Trata-se de um voo com alguma turbulência, principalmente devido à potencia da térmica. As mangas tiveram entre 34 a 68km, com cerca de 40% de pilotos no golo. Todas as mangas foram alucinantes, super rápidas, fazendo quilómetros e quilómetros sem enrolar uma única térmica. Apenas a aproveitar o dinâmico e travando a asa um pouco em algumas das térmicas mais fortes que não se conseguem ultrapassar de acelerador. A oeste o mar, e a leste o deserto do Atacama. O cenário é fabuloso. Durante o voo deparei-me com a existência de confluências situadas entre o mar e as cristas. O vento ao nível do mar é SW. Porém, ao nível das nuvens, verifique pela sombra que as nuvens se deslocavam de SE, terminado a sua deslocação entre o mar e as cristas. Isto é, não haviam nuvens no mar, nem para o interior. Apenas uma confluência marcada por uma linha de nuvens com pouca expressão. Mas apesar das nuvens terem pouca expressão, a confluência apresentava um potencia considerável. Pelo que consegui entender, a geração de calor que depois se liberta na forma de térmicas nas falésias (sobre o vento SW) é suficientemente potente para criar uma depressão sobre as cristas, permitindo a afluência de ar do quadrante SE. Esta situação apenas acontece nas falésias mais altas (mais de 600 a 700m). Julgo que também o facto de ter uma fonte de calor mais alto também ajuda a melhorar a consistência da confluência. O calor que se gera já na zona das plataformas mais altas acaba por ser "sugado" pela depressão criada nas cristas. Conclusão: uma confluência junto ao mar e com ascendentes consistentes de +4 a +5. Na minha opinião Iquique é um local a visitar pelo menos uma vez. Pelo que sei para o ano terão de novo este campeonato. Certamente que terão ainda mais pilotos presentes. A consistência do local é única, um dia...uma manga, não há que enganar.

Fotos: Mona