sexta-feira, novembro 25, 2005

O XCeará 2005

por Miguel Costa

Olá a todos.
Finalmente tenho algum tempo para dizer algo sobre o XCeará, embora o Gonçalo e o Diogo já vos tenham dado um pouco do perfume...
Queria também antes de mais agradecer a todos pelo apoio e mensagens de felicitações que nos enviaram.
Em relação a esta bela semana que já passou, é de salientar o bom ambiente vivido entre nós, e com todos os elementos, quer da organização, quer entre os pilotos.
Daquilo que já foi dito, alguns dados a reter são:

O vento impressionante, as descolagens hardcore (que se fosse assim cá, duvido que alguém descolasse), a grande possibilidade de se marrecar na 1ª parte do vôo, o sofrimento físico e psicológico de vôos muito longos, o acordar cedo, e pior- deitar cedo, a organização bem preparada, as recolhas a funcionarem com tantos pilotos espalhados por centenas de kms.
É bom recordar o descolar ás 9.15 e apanhar +10 (a térmica mais forte do dia), entubar a 1.300 metros (tecto inicial) e depois sofrer para não ir para o chão durante os primeiros 70 km, fazer muitos kms de nuvem em nuvem, mas tambem muitos no azul dependendo dos dias, passar por vários tipos de relevo e vegetação, e deserto...ah,ah,ah...impressionante a cordilheira que se vê no km 200, onde se vê uma parede até se perder de vista para norte, e para sul, onde se passa para um planalto, e o fim do dia a voar quando se pensa que já não dá mais e fazemos mais 70, 80 kms... e o aterrar , onde não se pensa que existe alguém, e aparecem 200 mininos...
Qua
ndo é a próxima ????


Miguel Costa

quinta-feira, novembro 24, 2005

O VOO do XCeará 2005

por Diogo Pires
Começo por agradecer publicamente a todos os que, das mais variadas formas, me felicitaram quer pelo resultado geral quer pelo voo em si.
Feitas as contas foram 810km voados em apenas quatro voos, o que dá muito para contar.
Calculo que muitos estejam ansiosos por saber pormenores, por isso partilho com vocês um texto que relata o maior voo que já fiz, para mais tarde recordar.
Estou à disposição de todos, para esclarecer alguma dúvida, ou satisfazer alguma curiosidade através do e-mail jdiogoppires@mail.pt .
Tenho também perto de 200 fotos que mais tarde posso por on-line.

Obrigado a todos, e cá vai:
Dia 18 de Novembro de 2005
O dia começou cedo na pousada "Pedra dos Ventos", local fantástico onde ficamos hospedados durante toda a semana, e onde era também o centro de todas as operações.
Ás 6.30h foi a hora da alvorada, o Gonçalo foi o primeiro, a seguir eu, e o Miguel como de costume a aproveitar todos os minutos, levantou-se ás 6.45h.
Descemos para o pequeno-almoço (sempre muito completo, nunca sabíamos quando íamos comer outra vez), a azáfama já era grande, pois era o último dia de competição, e ainda estava tudo em aberto em termos de resultado final, já tínhamos dois voos descartados e este dia ia ser decisivo.
A pressão era grande, uma vez que eu já tinha estado em primeiro e estava agora em terceiro, com dois grandes pilotos à minha frente, o Bret dos Estados Unidos e Tomas da Macpara, embora a diferença fosse pequena eu estava em desvantagem, por isso tive de ter muito cuidado nas decisões.
O primeiro carro subiu ainda não eram 7.15h, e o meu saiu pouco depois das 7.30h.
A meio caminho da descolagem vejo já um piloto no ar, eram 7.45h, não era o Ceará como de costume, mas também não cheguei a saber quem era, estava c
oncentrado no Bret e no Tomas.
Eram agora 9.00h já tínhamos tudo pronto para descolar, e foi o que fez o Tomas, já estavam a voar uns cinco pilotos. Analisei os ciclos, e tinha boas janelas para descolar, 20 a 30 km/h durante menos de um minuto, depois subia rapidamente para os 50 km/h.
Com a indispensável ajuda dos meninos da "Juatama" (aldeia em frente a descolagem), descolei ás 9.12h, logo a seguir á Petra e ao Gilmar, estava já o Tomas a partir alto, e o Bret ainda a preparar. Resolvi descolar no meio dos dois, assim achei que seria mais fácil controlá-los.
O ciclo foi bom para descolar mas mau para subir, tive de esperar em frente á rampa, e lá veio uma térmica muito derivada que já não me deixou regressar. Contra-derivei para norte, por cima da lagoa de Quixádá, o que não é muito habitual, mas todos os pilotos que vi na rota estavam baixos.
Logo de seguida era eu quem estava em apuros, o tecto ainda era baixo (1300m), as habituais nuvens eram escassas, e o vento partia as primeiras térmicas do dia.
Embora baixo, o voo começou mais ou menos rápido, tinha que enrolar zeros, cair numa descendente era a morte do artista, não dava para procurar núcleos.

Acontece então um problema grave, fiquei sem bateria no rádio (tinha uma de reserva, mas não podia trocar), agora já não conseguia controlar quem queria, e pior, não ia poder transmitir a minha posição (nesta prova por questões de segurança e logística, os pilotos vão
informando os quilómetros percorridos).
Logo desde o princípio do voo tive de me preocupar só comigo e deixar os outros dois, embora tivesse noção que não estaríamos longe uns dos outros.
Só no quilómetro 50 é que consegui finalmente chegar à base (1800m), então foi "via verde" até aos 100 uma estrada de cúmulos fantástica, com boas formações e térmica forte, o dia parecia estar a melhorar.
Mas não, rapidamente estou de novo baixo e numa zona bastante complicada de passar, do quilometro 100 ao
150 existe uma cordilheira que começa com morros pequenos que vão crescendo até uma serra que normalmente é contornada pelo lado norte, só que "nuvens de grilo", as condições tinham piorado, o ar era seco e as térmicas saiam aos remoinhos.
Estávamos 3 pilotos em apuros, 2 parapentes e uma delta. Procurei o venturi de um desses morros e lá fui, a derivar muito e a subir pouco em direcção ao centro da serra onde uns pequenos cúmulos davam a indicação de o tecto ser um bocado mais alto do que até aí.. O outro parapente aterrou e a delta continuou até à serra onde acabou por se acidentar, fez um "tumbling" e o piloto caiu em cima da asa, aterrou com o reserva e teve algumas lesões não muito graves.
É durante esta deriva que me apercebo que o Bret andava muito baixo, mais ou menos na minha posição, e pareceu-me que ia ficar por ali, só me faltava o Tomas.
Continuei:

Já no centro da serra, e alto, vejo uma asa a tentar subir numa ligeira crista no sotavento da serra – era ele!
Sem ter 100% de certeza de ser o Tomas, saí da rota 45º para sul onde supostamente se formaria uma confluência com a junção do vento que se dividia para contornar a serra e se volta a juntar no sotavento
formando assim uma linha de ascendência de vários quilómetros. Quanto mais forte é o vento no solo, mais longa é essa linha.
Dito e feito! Fico baixo, vejo o Miguel bastante alto, mas rapidamente subo dos 780m aos 2820m e distancio-me tanto do Tomas como do Miguel, seguindo agora a tal confluência fora da rota, e a partir daqui nunca mais vi ninguém.
Eram 13.20h, hora de almoço, estava no quilómetro 180, e contra o meu costume lá fui comendo umas barritas de cereais, e o isostar, indispensável para combater a desidratação.
A planície era longa até ao quilómetro 210, mas com uma sequência de ciclos bem encadeados foi fácil.
Chega então a famosa serra da Ibiatapa, cordilheira que se estende por 150km perpendicular á rota, e na qual existiam vários incêndios.
Se por um lado o tecto sobe em cima da serra, por outro o fumo dos incêndios estava a complicar a vida, pois não havia qualquer nuvem no planalto que se segue á serra.
Decidi não corrigir a rota, e continuei desviado para sul, a tentar seguir o percurso do voo do primeiro dia, que também me levou longe (279km).

E funcionou, ciclo atrás de ciclo, a minha preocupação era agora manter-me a voar fosse em que direcção fosse, pois sabia que ia ser ao longo daquele planalto com 30km, que muitos pilotos iriam aterrar.

É nesta fase do voo que tive de aplicar a regra numero "um" para quem faz voos de cross, que é manter-me a voar, fosse para onde fosse. Querer ser rápido nesta altura, ou condicionar o meu voo há rota estabelecida, ia por em risco o trabalho feito até aqui.
É uma área complicada, sem viva alma, é chamada área em litígio, pois nem o estado do Ceará nem o do Piauí a querem devido a não ter mesmo nada.
São 15.20h e estou no quilómetro 280, mesmo por cima do local onde aterrei no primeiro dia (estava a seguir a mesma rota) tenho uma hora de adianto em relação a esse voo e ainda me restam duas horas para voar.
É aqui que começo a acreditar que tudo pode acontecer.
Sem hesitar continuei para uma travessia de 40km, onde a vegetação continua densa, mas agora mais verde. (Esta vegetação chama-se Jurema e é na opinião de muitos pilotos uma enorme fonte de calor, pois é composta quase e só de paus secos que não projectam sombra no chão, mas que por sua vez impedem o vento de varrer todo o calor acumulado.)
Só que agora mais verde já funciona ao contrário, e tenho é que procurar zonas peladas, o que se torna numa tarefa difícil pois o aspecto da vegetação parece uniforme.
A partir daqui a companhia dos Urubus foi preciosa, pois com o sol de frente é difícil avaliar o terreno, e como as nuvens eram poucas e muito pequenas eles eram fundamentais para me manter em voo.
Era hora do lanche, apesar de não me apetecer, tinha consciência que para manter o nível de concentração tinha que me alimentar, e foi o que fiz, já estava a voar há quase sete horas.

Sem povoações, sabia que aterrar nesta altura estaria a várias horas de caminho de qualquer aldeia e que de certeza teria de passar a noite no mato.
Apanho uma térmica que provavelmente seria a última, com muita paciência e sem ansiedade chego pela primeira vez aos 3000m.
Eram 16.55h e estava com 340km.
Inicio o ultimo planeio com vento totalmente pelas costas, com uma finesse média de 15, e cruzo a principal
estrada do estado, quando me apercebo que já alguns carros trazem as luzes ligadas, estava a anoitecer (a 3000m temos mais luz do que á superfície).
Chego à povoação de "Cabeceira" (vem no mapa do garmin 76S), quilometro 370, mas ainda tenho mais ou menos 800m para o chão.
Foi aqui a decisão difícil, tinha duas opções, ou aterrar ali ou entrar numa mata de palmeiras e outras arvores altas.
Sabia que recorde Sul Americano era 377km, e sem pensar na hipótese de aterrar ali naquela aldeia, continuei… Agora sim, com mais ansiedade quase não tirava os olhos do GPS a contar cada 100m que andava.
Já estava para tudo, alguma daquelas palmeiras me ia parar se não batesse o recorde.
É então com 381km que encaro o vento e ponho os pés no chão num cruzamento de cami
nhos no meio do nada.
Sem saber bem o que fazer, reparo que está mesmo a ficar escuro. Desequipo-me a correr, começo a dobrar a asa e acabo já com a lanterna na mão.
Aparecem então uns miúdos e graúdos que me seguiram desde a aldeia, confesso que tive medo, pois não sabia como iriam reagir. Disse que estava perdido e precisava de ajuda para sair dali. Depressa mostraram vontade em ajudar-me e foram chamar um senhor que se prontificou a levar-me à aldeia. Era uma carrinha Opel muito velha, 1970 talvez.
Cheguei à aldeia e liguei de imediato ao Chico, não sabia de mim desde de manhã, já estava preocupado, mas cheio de alegria, logo confirmou que o voo que eu
acabara de fazer era recorde.
Também me informou que o carro de recolha já não me ia buscar naquele dia, e que eu ia ter de dormir por lá. Então procurei estadia no único local possível "Dormitório Brisa do Lago". Era um pátio com camas de rede de baloiço e dois quartos muito manhosos nas traseiras, por acaso um estava livre e foi ali que fiquei.
Era gente muito simples, simpática e acolhedora. Queriam saber de tudo e depois de uma longa conversa, ate me consideraram mais sábio que o Papá.
Ás 10.00h da manhã do dia seguinte chega a minha recolha, mal sabia eu o que me esperava. Depois de quatro horas de caminho fomos infor
mados, que 26 pilotos tinham descolado, num dia que aparentemente era melhor do que o anterior, mas que já não contava para a prova.
Pensei logo que embora o golo fosse em "Poranga", 215km, ia haver gente a continuar, e confirmou-se.
Cheguei a Quixádá ás 11.00h da noite (trinta horas e meia depois de aterrar), e fui informado que o Tomas tinha descolado neste dia e fez a ultima comunicação ás 16.45h no quilómetro 340km a 3000m de altura.
Pensei logo que o meu recorde tinha durado apenas 24h. Foi uma noite de agonia.
Só no dia seguinte é que o Chico teve comunicação com o Tomas, e soube onde ele tinha aterrado.
Ligou-me de imediato e disse: "O recorde ainda é teu, o Tomas SÒ fez 365km"
E assim termino o relato desta incrível experiência.
Não consigo ficar indiferente a esta aventura, por isso a passei a papel e à qual dou o nome de "O VOO".


Diogo Pires


PS: Os resultados do XCeará 2005.

quarta-feira, novembro 23, 2005

Mais impressões do XCeará 2005

por Gonçalo Velez
Mais impressões do XCeará:
O vento em altitude não me parecia muito diferente do da descolagem, mas devia ser bastante mais forte. Não sei dizer, especialmente por nunca termos visto um único dado de meteo durante toda a prova! Sentia uma grande ventania quando punha o acelerador a fundo, costas ao vento.

O Diogo dizia-me para só acelerar na descendente, mas eu acelerava sempre nas transições fosse ascendente ou descendente. Gostava de ouvir outras opiniões sobre este aspecto.
É curioso ver as nuvens a aproximarem-se com velocidade, parece que vêm ao nosso encontro, mas é o contrário, nós é que viajamos depressa na sua direcção.
A velocidade máxima que registei foram 86 kmh. Nesse voo fiz tecto 4 vezes com mais 4-5 picos menores.
Enrolava-se com muita deriva. Cheguei a Madalena (km 66) bastante baixo e aí apanhei uma térmica. Fui enrolando, sempre enrolando e comecei a ver a vila muito ao longe.

Agora vejo o track no computador e apuro que enrolei 23 km, de 994m a 2250m. Curioso, hein?

Gonçalo Velez

terça-feira, novembro 22, 2005

Segurança em bi-lugar

por Gonçalo Velez
Aprendi algo muito interessante no domingo passado:
Houve um casal de Marselha que participou na prova em bi-lugar.
O Roland muito experimentado diz que é uma forma de conseguir conciliar o voo com os interesses da mulher, a Cosette, e que muitas vezes passam férias a fazer voo-bivaque nos Alpes e que transpoortam tenda, sacos cama, cozinha etc!
Ele também voa frequentemente com amigos e tem uma atitude muito interessante e tranquila relativamente ao voo (http://cosette.et.roland.free.fr/)
Disse-me que em França é obrigatório num bilugar as fitas do paraquedas de reserva estarem ligadas por uma cordeleta às bandas B. É o
sistema André Rose.

Assim, quando se lança o paraquedas a asa fica automaticamente anulada pelas bandas B pois diz que é quase impossível, fisicamente, um piloto fazer bandas B num bilugar durante muito tempo.
Ele usa mosquetões de abertura rápida para soltar as bandas em caso de emergência, especialmente se estiver em risco de ser arrastado na descolagem ou na aterragem. Diz que já os usou pois descolam a maior parte das vezes em montanha em locais não preparados para descolagem e só os dois.
Perguntei-lhe como faziam no caso do monolugar que tem um acelerador agarrado ás bandas.
Disse-me que há um "mosquetão" que tem um escape e que se liga às bandas. Quando estas se destacam da selette dão um puxão no cabo do acelerador que se solta devido ao tal "mosquetão".

Gonçalo Velez


Fotos: Cosette e Roland.

XCeará 2005

por Gonçalo Velez
Algumas impressões do XCeará:

A mais marcante é a descolagem!
Os brasileiros bem informam que aquel
es ventos, os alísios, levaram o Pedro a "descobrir" o Brasil.
Não queríamos acreditar no que estávamos a ver! Ventos de 30-40 kmh quase constantes. Descolar era um ritual solene que exigia muita coragem. Primeiro havia que abrir a asa em local abrigado, retirar todos os gravetos do voo de véspera, verificar todas as linhas, depois equipar-nos completamente e transportar a asa em cogumelo para a borda da descolagem que tinha uns 40º de inclinação, piso de terra, à espera de vez. Cada descolagem podia demorar muito tem
po à espera do ciclo baixo o que, com luvas, fato, etc provocava muita transpiração! Ar acima dos 30ºC no plano.
Para termos alguma segurança havia que observar dados naturais para decidir quando inflar:
a) quando o lago à frente estava encapelado era sinal de que passava uma térmica que quebrava um pouco a intensidade do vento, e o mais importante,
b) uma árvore 100 mtr abaixo da descolagem, de ramos secos, quando abanava era sinal de vento forte. Quando parava de abanar indicava um ciclo baixo, passados 3-4 segundos confirmávamos
essa baixa (o tempo do ar se deslocar até nós), se a árvore continuava parada sabíamos que tinhamos 3-4 segundos para inflar em relativa segurança.
A organização
tinha uma equipa de rapazes treinados para ajudar à descolagem. Logo que pousávamos o cogumelo abriam-nos a asa e travavam-na com o corpo - 4 rapazes por asa. Às vezes estávamos longos minutos à espera de um ciclo baixo, suando. A asa tinha de subir direita senão podia ser um desastre.
Não esquecer de fazer muita compensação de energia correndo para ela, e virar logo. Imprescindível bons reflexos de correcção pois os planos podiam sair alterados no caso de se impor uma rajada súbita, a asa avançar demasiado
sobre o piloto ou inflar assimetricamente. Muita rapidez na correcção!
Viram-se todo o tipo de incidentes felizmente, sem consequências, excepto esfoladelas e um ombro deslocado de um francês que descolou e pendulou contra o chão. Também houve arborizações à frente, atrás e ao lado da descolagem.
A mim aconteceu-me um episódio preocupante
em que um desses rapazes ficou agarrado à ponta da asa enquanto o restante inflava. Isto ocorreu em simultâneo com uma rajada. Não tive tempo de corrigir: trepada em reverso face à encosta, pêndulo brutal, correcção com a mão errada, contra-correcção rápida, rodo 180º, subida na vertical, grande frontal 5 mtr acima da descolagem, a asa sem velocidade a recuar e a subir, depois estabiliza e avança com acelerador a fundo. Tudo isto num intervalo de tempo muito curto.
Houve 2 dias em que não voámos pois o vento era um exagero.

A organização anuncia 100% de dias voados mas... só para asa delta ou para pilotos temerários.
O público batia palmas às descolagens mais ousadas e que lhe causava enervamento!
As aterragens tinham o mesmo calibre.
Nem pensar em aproximar a pensar que
avançamos contra o vento e que chegamos à clareira visada. A aproximação era feita na vertical do sítio em que queria aterrar. Às vezes fazia a aproximação a barlavento e perto do chão fazia dois wingovers brandos para recuar até ao local pretendido.
Ainda estava a 100 mtr do chão e já se ouvia a algazarra de crianças que corriam para o local onde estava para aterrar. Estávamos sempre rodeados de crianças mal aterrávamos. Arboriz
ar no Ceará será uma experiência terrível pois os arbustos são espinheiros com 4-5 mtr de altura e densos!
Usei a minha serra uma vez por metade da asa me ter caído para cima de um que esta
va na borda da clareira.
O único acidente com gravidade ocorreu na aterragem. Um francês parece ter tido um fecho perto do chão e partiu a bacia e não sei se vértebras. A grande vantagem de aterrar no Brasil é que qualquer um com um veículo a motor nos leva onde queremos por um preço acessível. O pior são as dores de costas brutais por fazerem-se 10-20km na traseira de uma mota com a mochila ás costas!
Só por grande azar se aterra numa zona sem vivalma. A experiência foi sempre de crianças e adultos a correrem para a asa que aterra. Convidam para descansar em casa deles e oferecem comida. O cúmulo da hospitalidade foi, numa das recolhas já de regresso à descolagem, passarmos por uma aldeia e vermos um piloto italiano debaixo de um alpendre sentado à mesa comendo um excelente guisado! Esperámos imenso tempo por ele pois a família, muito modesta, não o queria deixar saír sem comer e mesmo assim ele entrou na furgoneta com um saco de plástico que continha uma grande embalagem de alumínio de onde saía um odor intenso a guisado! Apesar disso, voámos sempre com barras de cereais e muita àgua. Eu descolava com 4 ltr de àgua o que, além de servir para beber e de lastro, dá para refrescar a cabeça e a cara após a aterragem.
O local de voo faz lembrar Porto da Espada: pena-se durante 30 km para depois se voar mais à vontade. As térmicas mais brutais situavam-se na descolagem, o meu vario mediu máximas de 8.8ms a 13.5ms, e produziam descendentes igualmente brutais. Às 8h já havia térmica! Na maioria dos dias às 9h já o céu estava coberto de cúmulos. Depois voa-se quase até o sol se por... De costas para o vento voa-se com o sol de frente o que é pouco habitual aqui, e fica-se com os óculos bem marcados na pele!
A organização foi muito boa e as recolhas eficazes. Isso permitiu-me fazer quase sempre 2 voos por dia!
Ah... outro pormenor, o horário: acordar às 6h e 1ª subida para a descolagem às 7h30. Quem faz um voo de 40-70 km regressa ao hotel às 20h, para um voo de 90-130km às 0h, o Diogo após o voo de 278 km chegou às 5h30 do dia seguinte, e do seu voo de 380 km chegou 24h depois! O transporte é feito sempre em estradas de terra e através de quintas.


Gonçalo Velez